sábado, 31 de outubro de 2009

Minhas feridas
de sentimentos
ficaram em carne viva
também por isso
vivo lambendo-as.

Delmar Maia Gonçalves
Carcavelos, 20 de Janeiro de 2009.
Olhai gentalha
da vossa milimétrica
e fedorenta altura
para este humilde
e insignificante homo sapiens
prestai atenção!
Não fumo,
Não bebo,
Não tenho vís vícios
que me atormentem
a pacata existência
Embriago-me com a poesia
Fumigo-me com a prosa
Tomo café nos intervalos
e deleito-me com curvas afroditeanas
fazendo jus à minha existência.
Nada que se pareça
com os vossos luxuosos desvarios.

Delmar Maia Gonçalves
Fátima, 28 de Dezembro de 2008.

Chelas

Porque será
o chamamento
do degradado degredo
tão ruidoso?
Porque será
que tal chamamento
me indispõe.
Teria eu
sobrevivido
a tal mundo imundo
em intemporal jornada?

Delmar Maia Gonçalves
Alcântara, 8 de Fevereiro de 2009.
Cores aberrantes
me sufocam
humanos desumanamente
encaixotados
a inestética
de uma estética inexistente
observo
indisponho-me
estremeço!


Delmar Maia Gonçalves
Cruz Quebrada, 8 de Janeiro de 2009.

Cães rafeiros

Só se contentam com ossos os cães esfomeados e rafeiros. Um cão que se habituou aos bifes, rejeita os ossos.


Delmar Maia Gonçalves
Lisboa, 3 de Setembro de 2009.

O Morcego

O morcego é um animal grotesco. Mas não tão grotesco como o animal que há no homem.


Delmar Maia Gonçalves
Lisboa, 3 de Setembro de 2009.

Liberdade

Só tem Liberdade quem não tem Liberdade.



Delmar Maia Gonçalves
Lisboa, 08 de Outubro de 2009.

Estigma da lixeira

Bom demais seria combatermos a lixeira acumulada para que não fiquemos com o estigma do lixo. Mais um...


Delmar Maia Gonçalves
Lisboa, 9 de Setembro de 2009.

Lixo

Mau demais seria que nos deitassemos no lixo que nós produzimos.


Delmar Maia Gonçalves
Lisboa, 09 de Setembro de 2009.

És

Ao Dinis

És talvez
uma Lágrima de Deus
como uma gota
de orvalho no oceano.

És talvez
a suave Brisa matinal
que retempera forças.

És o anunciado Anjo astral.
És Luz cintilante na escuridão.
És a Esperança renascida.

Delmar Maia Gonçalves
Lisboa, 23 de Setembro de 2009.

Carta ao meu caro ex-amigo

Enfie a carapuça quem quiser!

Meu Caro Ex-Amigo,

Lamento que depois de tanto esforço inglório e vão, tenha de pôr um ponto final neste Carnaval que não é. Tanta imprudência mascarada só podia dar este epílogo. Procurava uma amizade genuína e encontrei algo com que não me identifico. Adeus! E boa continuação.

Delmar Maia Gonçalves
Lisboa, 23 de Setembro de 2009.


Post Scriptum
- de falsas amizades não reza a história.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Racismo não tem Futuro

Indignado estou pelos ventos de racismo que assolam Moçambique e dizer que, do meu ponto de vista, o racismo só faz sentido para pessoas frustadas ou culturalmente débeis, que procuram encontrar bodes expiatórios na questão racial para justificar os seus fracassos, fantasmas e medos.
Lutar contra o racismo e a xenofobia deveria ser princípio e prática universal.
Os cidadãos e políticos racistas de Moçambique não reconhecem, por acaso, qual foi o papel que os não negros moçambicanos da Frelimo, da oposição e não só desempenharam no longo processo que conduziu à Independência do País?
Que moral têm agora alguns senhores ditos moçambicanos, ditos donos de Moçambique, para pôr em causa a moçambicanidade de todos os não negros, através de cartas e artigos racistas, cobardes, com o agravante de se esconderem por detrás de intrigantes pseudónimos?
Para se combater o racismo pratica-se o racismo?
É esta a vossa máxima?
Por favor, meus senhores, não levem o odioso racismo para um Moçambique que está em construção.
O racismo não tem futuro em lado nenhum, nem os racistas, portanto, demitam-se os racistas! Fechem-se os esgotos, que cheiram mal!
Talvez por causa dessa burrice ainda haja moçambicanos a viver bem no estrangeiro, que não constroem empreendimentos válidos e permanentes em Moçambique, que poderiam contribuir para o desenvolvimento do País que é também deles. Talvez seja devido sobretudo, a homens como os senhores, racistas, xenófobos e invejosos, que não garantem segurança a ninguém.
De resto, não me interessa mesmo nada se vocês são negróides ou caucasóides, que se lixem as raças ou cores, podiam até ser invisíveis, não mudava uma palavra do que escrevi da minha visão do mundo. Talvez seja da minha educação... visual!
A todos os racistas e xenófobos moçambicanos desejo longas "reciclagens" multiculturais, multirraciais, interculturais, e inter-religiosas e que leiam muito Martin Luther King, Mahatma Gandhi, Nelson Mandela, Amílcar Cabral, Eduardo Mondlane, Samora Machel, José Craveirinha, o Alcorão, a Bíblia Sagrada, a Tora, o Gita, e se ainda assim fizerem tenções de continuarem racistas então vão à merda!
Os senhores não podem culpar a ninguém por nada, trabalhem, deixem os outros trabalhar e um dia colherão os frutos.
Moçambique sem investimento estrangeiro seria um país adiado e sem tolerância racial entre os moçambicanos, seria uma catástrofe.
Obviamente, vocês não são melhores que o falecido senhor P.W. Botha, porque se escondem por detrás de aberrantes pseudónimos, ele não o fazia, assumia-se como racista.
Mostrem as vossas caras! Têm medo de quê?
Têm vergonha de se assumir racistas?
Já uma vez na reinauguração do Hotel Polana, o antigo Presidente Joaquim Chissano afirmou acreditar que a evolução do pensamento humano indicava progressos na erradicação do racismo.
Subscrevo esta opinião e desejo francamente que o sonho do povo moçambicano pela melhoria da qualidade de vida se concretize.

In "Savana" de Maputo
Delmar Maia Gonçalves
08 de Novembro de 1996.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Principais medidas para o futuro do turismo nacional Moçambicano - um contributo

A conjuntura favorável que se vive actualmente na República de Moçambique, permite-nos pensar no relançamento do Turismo no país que já foi considerado o mais pobre e miserável do mundo pela ONU e os media ocidentais apesar de todo o seu potencial. A nova postura do novo Governo Democrático da Frelimo e a contribuição da oposição moçambicana liderada pela RENAMO para a consolidação do processo democrático em curso, a participação cada vez mais activa da sociedade civil no processo de reconstrução, leva-nos a apostar e a pensar Moçambique como destino turístico apetecível e viável, dentro de um quadro de medidas de investimento prioritário para criação de garantias de uma segurança efectiva que possibilite o desenvolvimento do turismo (como fonte e factor de riqueza) e consequentemente do país.
A estratégia de desenvolvimento do sector apresentará os seguintes vectores:
1. A defesa rigorosa da qualidade dos serviços e equipamentos através da elaboração de regulamentação resultante de legislação;
2. A melhoria do conhecimento e da base científica que constituem o apoio à tomada de decisões, quer do Sector Público, quer do Sector Privado (através da criação, desenvolvimento, investimentos em escolas desta área específica);
3. O aumento do investimento em equipamento de animação e respectivas infra-estruturas (sobretudo apostando na reabilitação, renovação e modernização das já existentes);
4. Reexame rigoroso do enquadramento ambiental e da qualidade estética dos equipamentos dos destinos turísticos;
5. A diversificação da oferta de produtos turísticos, investindo e promovendo o turismo a nivel nacional (nas zonas centro e norte sobretudo);
6. O reforço, descentralização e intensificação das acções inspectivas, em colaboração com as novas autarquias (Conselhos Municipais), de modo a controlar a qualidade dos pontos turísticos (por exemplo: condições das cozinhas, qualidade nas refeições, preços praticados, higiene das infra-estruturas e qualidade dos produtos).
7. O fomento dos factores relacionados com o acolhimento do visitante, no que respeita à hospitalidade, à higiene, à simpatia e à comunicabilidade do povo moçambicano;
8. A continuação do esforço de modernização de infra-estruturas, designadamente nos transportes, comunicações, energia, saneamento básico, telecomunicações, etc.

In "Boletim Tindzava"
Delmar Maia Gonçalves

domingo, 25 de outubro de 2009

Mofana Matusse

Mofana Matusse queria sonhar mas não sabia como.
O seu sonho chamava-se Pesadelo e o seu pesadelo era guerra.
Toda a gente se habituou a ver Mofana Matusse chorar. Toda a gente o chamava chorão.
Foram anos de solidão e tristeza!
De repente Mofana Matusse reaprendeu a sorrir e ninguém compreendeu porquê.
Mas eu sei e digo-vos:
Mofana Matusse reaprendeu a sorrir com o fim da guerra.
Mofana Matusse dança, canta e pula com o fim da guerra.
Mofana Matusse corre, salta e joga com o fim da guerra.
Mofana Matusse cultiva a paz, o amor e a amizade para que a guerra não volte jamais.


Glossário:
Mofana: rapazinho, menino, criança;


Delmar Maia Gonçalves
Parede, 25 de Junho de 1995.

Mulher XXI (Sensual-idade) em Sintra


Dois corpos
unidos num só
e no magestoso éden
ouvem-se sussurros
proibidos por entre
as frondosas árvores
do jardim proibido
Ouve-se o chilrear
dos pássaros
Ouvem-se ruídos
de fundo como parte
do idílico cenário
inspirador da acção
Ouvem-se vozes estranhas
que se aproximam dos vultos
endiabrados pelo prazer de viver
Ouvem-se passos
de estranhos insaciáveis e curiosos
Ouvem-se sinos de paixão, êxtase
e prazer na partilha
de um amor
que se quer eterno.


Delmar Maia Gonçalves
Parede, 16 de Maio de 1996.

As duas faces do Cão Tinhoso

"Quando os ricos fazem a guerra, são os pobres que morrem"
Jean-Paul Sartre


Cão tinhoso
era estranho
era guerra
era sombra
cão tinhoso
morreu
nasceu nova aurora
e com ela a esperança
agora cão tinhoso
é outro!
Não é estranho
mas é guerra
não é estranho
mas é sombra
e é nosso pai, nossa mãe,
nosso tio
e nosso irmão
a deseperança
instalou-se
aguarda-se
o renovar da aurora
e com ele
nova esperança.


Delmar Maia Gonçalves
Monte Estoril, 27 de Setembro de 2004.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Os Cadernos Moçambicanos Manguana

Os Cadernos Moçambicanos Manguana são um espaço de reflexão, divulgação, crítica, análise e debate, onde se pretende abarcar, não só a literatura moçambicana, como também as dos outros países de língua portuguesa. Constituindo-se como um grupo informal de amigos moçambicanos (1), em torno de uma paixão comum e partilhada, tem como objectivo dar expresão a um processo criativo, muitas vezes ignorado e marginalizado, trazendo-o para a luz do debate de ideias, de ideais, da crítica e da troca de opiniões. Tendo nascido num reencontro de moçambicanos na Embaixada de Moçambique em Lisboa, este projecto ficou decidido e definido na Livraria Ler Devagar em Lisboa.
Assumo como o desejo primordial a integração de um número cada vez maior de elementos moçambicanos, transformando-se, desta forma, num projecto abrangente, alargado e transversal.
Não se arrogando à pretensão de se vir a constituir como movimento ocorrente, normativa e/ou estilística. Procura antes, fazer da sua intervenção um passo, bem vincado, no amadurecimento de novos discursos, dando particular destaque a projectos de fusão com as outras linguagens culturais e artísticas. De cariz profundamente ecuménico, no que este assume de universalista, ao nível da integração em respeito pela divergência de conceitos, conteúdos e formas.
Fundamentalmente, pretendemos estabelecer uma ponte para o futuro, um sistema global de comunicação intercultural, e onde poderá surgir a realidade de um homem plural, aberto, flexível, capaz de assumir a unidade da lusofonia pela consolidação e divulgação da diversidade e da sua riqueza.

Delmar Maia Gonçalves
Parede, 03 de Fevereiro de 2004.
In Antologia Cadernos Moçambicanos Manguana nº 2 (contracapa)
(1) Constituido por Delmar Maia Gonçalves, Jorge Viegas e Renato Graça.

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Mudar Mentalidades

Expresso aqui uma crítica relativamente aos jornais e revistas portuguesas especializadas ou que escrevem e noticiam África.
Dedicam demasiado espaço à política , demasiado espaço aos políticos e dão pouca importância à sociedade civil africana, dando aos políticos africanos a ideia de que o poder é eterno, de que os países lhes pertencem, de que o prestígio e o poder são apenas encontrados na política.
Em nada contribuindo para a formação de uma opinião pública e de uma sociedade civil fortes, que possam fortalecer os Estados e democratizá-los.
Faltam mais atenção e entrevista a poetas, escritores, escultores, pintores, actores, professores, intelectuais, médicos, desportistas e tantos outros profissionais. É necessário um novo ordenamento social e uma nova mentalidade em África. E África Hoje pode contribuir para uma mudança de mentalidades que urge nos PALOP.
Não se admirem pois, quando os cidadãos portugueses ao reconhecerem um excelente estudante bolseiro africano digam logo "Você vai ser Ministro"! Quando na realidade até simples cidadãos trabalhadores podem contribuir para o desenvolvimento dos seus países.
Ou será que todos os quadros africanos formados no exterior serão ministros, directores ou dirigentes políticos?

Delmar Maia Gonçalves
In Revista "África Hoje" nº99
Parede, Setembro de 1996.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Os Desmobilizados

Antes e depois da concretização do acordo de paz de Roma para Moçambique houve promessas de apoio aos desmobilizados moçambicanos, tanto a nível internacional, como nacional.
Embora partilhe a ideia de que todos temos os mesmos direitos e obrigações perante a lei, reconheço, no entanto, que em muitos casos há uma grande diferença entre a teoria e a prática.
Hoje, em pleno exercício de uma democracia emergente em Moçambique , os desmobilizados continuam numa situação dramática abandonados à sua sorte.
Diz-se que a necessidade aguça o engenho! Mas o que fazer com alguém que só conseguiu resolver os seus problemas diários com a ajuda de armas e que provavelmente só sabe lidar com armas?
Não será correcto também dizer que a necessidade aguça o apetite dos desmobilizados (militares e polícias) pelas armas?
Sempre ouvi dizer que "mais vale prevenir do que remediar", que "o prometido é devido", que "a paz não é a simples ausência de guerra" e que "a paz ou é de todos ou não é de ninguém"!
Chegou a altura de os desmobilizados serem integrados e enquadrados na sociedade moçambicana.
A marginalização, a exclusão, o desprezo, a indiferença, a memória curta, o esquecimento e a ausência de solidariedade, não são os valores por excelência que sempre guiaram os moçambicanos, é pois altura de mudarmos de atitude ou então jamais nos esqueceremos do velho ditado "quem semeia ventos colhe tempestades".

Delmar Maia Gonçalves
In Revista "África Hoje" nº110
Parede, Outubro 1997.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Velhos Fantasmas

Enquanto em Angola ainda se tentam limar arestas para a resolução definitiva do conflito, em Moçambique, uma vez ultrapassados os possíveis obstáculos à paz (realização de eleições legislativas multipartidárias e presidenciais, acordo para a formação das novas forças armadas e formação da nova polícia), aguardam-se as eleições autárquicas.
Entretanto, lamentavelmente surgiu um debate polémico, em torno da questão da morte de Lázaro Kavandame, ex-militante da FRELIMO e supostamente executado por traição, pela própria FRELIMO.
Num momento crucial para o fortalecimento das instituições democráticas de Moçambique e da paz, ainda há pessoas que teimam em prejudicar o processo desenterrando "velhos fantasmas", que em nada ajudarão na reconciliação nacional. Com o devido respeito que tenho pelos familires das vítimas, não será tempo de nos preocuparmos com o desenvolvimento do nosso país e com a manutenção da paz, em vez de alimentarmos factores de divisão que só fazem renascer os ódios e as sedes de vingança?
É preciso não esquecer que ficaram muitas mortes e actos de violência por explicar e entender (da guerra colonial, dos "raids" sul-africanos, dos mercenários de Ian Smith e da guerra entre a FRELIMO e a RENAMO), mas e que adiantaria num momento destes provocarem-se debates deste tipo? Por vezes, fedem que enojam!
Não nos bastam as zonas rurais ainda minadas, e a ainda não resolvida questão dos esconderijos de armas como o de Marínguè, que já dão dores de cabeça aos verdadeiros interessados na paz e desenvolvimento de Moçambique?
Por Deus, deixem de brincar com o povo moçambicano!

Delmar Maia Gonçalves
In Revista "África Today" nº91
Lisboa, Janeiro de 1996.

domingo, 4 de outubro de 2009

As hipóteses de Obama...
E se Barack Obama fosse Africano?
Jamais chegaria à presidência de um país. Seria considerado Africano de segunda. Mandavam-no para a terra da mãe(contrariando o habitual que enviarem-no para a do pai) . Chamar-lhe-iam branco de terceira. Redigiriam uma nova Constituição que impedisse a sua eleição, tendo em conta a sua genealogia familiar. Já estaria provavelmente morto. Não passaria de um miliciano. Jamais poderia ser Marechal. Jamais poderia ser Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas. Jamais poderia ser General. Jamais poderia ser Coronel.
Por fim, não seria jamais o Presidente dos Estados Unidos da América, adiando o "futuro" ad aeternum.


Delmar Maia Gonçalves
Lisboa, 29 de Setembro de 2009.