domingo, 28 de setembro de 2014

“DIAS SERENOS” de LUÍS PEDRO PROENÇA


A iluminação espiritual tem algo a ver com o ponto do espírito onde o alto e o baixo, o interior e o exterior, o superior e o inferior, o sonho e a acção, o real e o imaginário, deixam de ser percebidos contraditoriamente.
Assim que se começa a estudar o zen, uma árvore não é uma árvore, um rio não é um rio. Deixam de o ser. Assim que se atinge a iluminação espiritual, uma árvore é de novo uma árvore, um rio é de novo um rio. O método que consiste em não seguir nenhum método é o método por excelência.
Alguém duvida?  
O dia e a noite deixarão de opor-se. Na realidade, nunca se opuseram.
A raiz comum na imaginação será reconhecida. Sendo o exterior à imagem do interior, a vida será uma autêntica obra de arte. Na verdade, uma obra-prima única e inigualável.
O nosso intelecto é inegavelmente necessário para compreender as próprias limitações.
Segundo a experiência e perspectiva zen, o verdadeiro conhecimento é inseparável da experiência imediata. És posto à prova sozinho.
Mas se o homem olhar bem para dentro de si, adquire indubitavelmente a consciência superior da sua magnífica solidão, que o isola sim, mas não separa do resto da existência.
Aquele que é senhor de si mesmo, que é capaz de ouvir o que os outros dizem e não dizem, penetrando no pensamento com uma agilidade mental admirável, estará em condições indiscutíveis de compreender mil e uma coisas diferentes de uma realidade sem nome e sem forma definida.
A definição, mais ou menos clássica ou  mais ou menos académica, só satisfaz aqueles que querem  rotular o conhecimento separado da própria vida. O verdadeiro conhecimento não é rotulável nem hierarquizante. E nunca em momento algum deveria ser separado da vida.
O zen oferece-nos condições para que vivamos completamente livres do condicionamento das emoções negativas sempre nefastas, e da condição de alienados.
A humildade é portanto a condição número um para que tal suceda. Mas também não podemos esquecer a dedicação constante e diária para nos conhecermos e para vigiarmos o nosso comportamento inconstante.
No que à grande quietude do Poeta iluminado diz respeito, ele nunca está sereno por se dizer que a bendita serenidade é excelente. Está sereno porque a enorme e gigantesca multidão de coisas não pode jamais perturbar a sua serenidade, jamais!
As palavras fazem amor. As palavras- actos e não as que pressupõem actos.
Nós passamos a respirar as palavras – actos. Não há separação.
E isto só é possível com o zen. Ou não?
Quando “trabalhamos” somos como flautas e no nosso coração o murmúrio das horas, do tempo soa como música. Uma música harmoniosa.
E o que é trabalhar com amor? É tecer o nosso pano com os fios do coração, como se estivéssemos a tecer e moldar a roupa do nosso mais que bem amado universo em que viveremos.
Recordando o grande Poeta RABINDRANATH TAGORE diremos então que “ Sobre as tramas do nosso finito que é infinito e cuja tapeçaria bordamos quotidianamente nossas vidas, acaba sempre visível a mais ínfima nódoa!”
Por isso se torna vital a nossa harmonização interior para que expressemos um exterior muito mais transparente, mais sereno e sem mácula.

DELMAR MAIA GONÇALVES

(ESCRITOR e PRESIDENTE DO CÍRCULO DE ESCRITORES MOÇAMBICANOS NA DIÁSPORA – CEMD)

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