quarta-feira, 12 de agosto de 2009

O meu avô Dalas e o Sporting

Chamava-se Dalas era moçambicano, respirava futebol e vivia intensamente o Sporting Clube de Portugal na longínqua e pacata cidade nortenha moçambicana de Quelimane, na Zambézia. Perto dele ninguém se atrevia a dizer mal do Sporting. Ele próprio era o Sporting, com o seu português refinadíssimo, pura poesia!
Era um “espectáculo” dentro do espectáculo.
Dalas significa na língua local chuabo “fome”, e quanto ao “s” parecia sempre sugerir Sporting, uma feliz junção, que dava qualquer coisa como fome de Sporting latinamente falando.
Para ele, todos os bons jogadores deveriam jogar no Sporting Clube de Quelimane. E julgo que tinha razão! Era uma fábrica de talentos!
O ex-Sporting clube de Quelimane tinha então ganho o último título provincial em 1979, com uma equipa de sonho: Chico, Caetano, Camilo, Cadango, Banda, Zé Manel, Gastão, Pélé, Faruk, João Onofre, Lobo; e como suplentes: Cassimo, Jarres, Sérgio, Carrasco, Jaime, Moreira,Pela e Cheta; orientada pelo Professor José Geneto. No ano seguinte foi a razia completa, uns foram cumprir o serviço militar, outros foram reforçar outras equipas mais poderosas. Depois, foram longos anos de jejum e um crónico lugar de vice-campeão atrás do excelente e irreverente Clube Cessel do Luabo; em 1980 venceu já com uma nova designação de “Palmeiras” (coisas da revolução!) a Taça Disciplina do Campeonato Nacional, com a proeza de nenhum jogador seu ter apanhado cartões. No entanto, isso não impediu que o clube acabasse a competição sem pontuar, na última posição, proeza que viria de resto a repetir em 1981.
Já em 1985, venceu o campeonato provincial justamente, imagine-se na secretaria da Associação Provincial de Futebol da Zambézia, em face de um empate 2-2 em casa, no Campo 7 de Abril, e uma derrota 0-1 fora, na finalíssima com o Desportivo de Mocuba. Houve alegria mas não tanta, foi uma vitória amarga.
A justificação para a atribuição do título ao Palmeiras, foi uma suposta má inscrição no Desporto de Mocuba de um ex. jogador do Palmeiras que alinhou nos dois jogos da finalíssima pelos Mocubenses e que não estaria desvinculado do Clube Verde e Amarelo, por não possuir a carta desobriga.
Passaram-se entretanto seis longos anos de jejum para o Palmeiras, para desgosto do avô Dalas. Em 1991 o Clube voltou a vencer o campeonato provincial, desta vez no campo e o velho Dalas que já andava doente, acabou por sucumbir.
Ficou mais pobre o futebol zambeziano sem esta figura peculiar.
Morreu doente, mas terá morrido decerto descansado, pois o seu Palmeiras, aliás Sporting (juridicamente nunca deixou de o ser) venceu, tornou-se campeão e avô Dalas imortalizou-se. Merecia uma estátua aquele soba!
Entretanto, o Palmeiras, voltou a chamar-se oficialmente Sporting Clube de Quelimane, a partir de 1994, um velho sonho do avô Dalas e o Sporting Clube de Portugal venceu a Taça de Portugal de 1994/1995. De resto não sei se a sua alegria foi total ou apenas parcial. É que o Sporting Clube de Portugal, o seu Sporting- Mor foi adiando as suas promessas de vitória nos sucessivos campeonatos portugueses.
Finalmente em 1999/2000 o Sporting Clube de Portugal venceu o Campeonato de Portugal quebrando o longo jejum de títulos. Houve muita festa e o avô Dalas certamente rejubilou de alegria.
Era o meu avô Dalas (uma grande figura do futebol Zambeziano) e eu ainda não o esqueci.
Siavuma pois avô!


Delmar Maia Gonçalves
(Escritor e Presidente do Círculo de Escritores Moçambicanos na Diáspora - CEMD)
Madorna, 5 de Julho de 1994.

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